quinta-feira, 7 de março de 2013

      




 
 
 
Maria Schaun
 
Escreve:

 
 

ELVIRA FOEPPEL
 
 
  
 
 
A VIOLETA GRAPIÚNA
 

Uma menina  como tantas outras que viviam em Ilhéus, nas décadas de 1930/1940. Descendente de imigrantes alemães em terceira geração, era a filha mais velha de um funcionário dos Correios e Telégrafos e de uma dona de casa. Estudava no Colégio Nossa Senhora da Piedade, onde a adolescente calada e introspectiva não apresentava nenhuma característica excepcional. Concluiu o magistério em 1943 e até deu aulas numa escola rural, mas ser professora não era a sua vocação.
 
Fez amizades que se perpetuaram e participou, desde cedo, das atividades culturais da escola, inclusive, mais tarde, encenando algumas peças no Teatro Municipal de Ilhéus: Os Divorciados, de Oduvaldo Vianna, e As Máscaras, de Menotti del Picchia, ambas abordavam temas avançados para a época e eram polêmicas. Isto fez com que seus contemporâneos a considerassem como uma das precursoras do feminismo em Ilhéus. Entre a fase da adolescência e fase adulta, pouco ficou registrado na memória das pessoas que a conheceram.
 
Mais madura e consciente do seu conhecimento sobre literatura e filosofia, tornou-se uma pessoa angustiada com as limitações impostas pelas convenções morais e sociais da pequena cidade, pois tinha ânsia de liberdade e ânsia de viver além do que estava previsto para uma moça de sua época – ser esposa e mãe. Foi aí que Elvira Schaun Foeppel, nascida em 1923, percebeu sua veia literária e teve 28 poemas publicados pelo jornal Diário da Tarde, no período de 1944 e 1947.
 
Nesse período de sua vida, Elvira Foeppel foi reconhecida como intelectual e vivia nas rodas dos literatos da cidade, participando das conversas no bar de Barral, um ponto de encontro na Marquês de Paranaguá. Exótica, andava sempre bem arrumada e com sapatos de salto alto, pintava os cabelos de vermelho, ruivo ou preto e copiava modelos de revistas de moda para que sua mãe costurasse seus vestidos. Vaidosa e cuidadosa com sua aparência, andava maquiada, com os olhos pintados de negro e batom forte nos lábios.
Mulheres com comportamento semelhante, naquele período (era a época do Estado Novo de Getúlio Vargas, do Integralismo de Plínio Salgado e dos militantes comunistas, liderados por Luís Carlos Prestes), foram internadas como loucas em manicômios de vários lugares do Brasil. E Elvira pagaria um preço alto por transgredir os limites impostos por seu tempo. Sua personalidade forte e seu comportamento audacioso incomodavam à sociedade ilheense. Incompreendida, vítima de preconceitos e marginalizada, apesar de ser uma pessoa extremamente religiosa e ligada à família, um dia partiu para o Rio de Janeiro (1947), levando na bagagem o desejo de ser independente e conquistar o mundo. O Rio de Janeiro era a metrópole, um lugar maior, onde teria mais oportunidades.
 
Lá, trabalhou como secretária da revista Súmula Trabalhista, da Legislação Federal, aposentando-se como redatora chefe, após 30 anos de serviço, na década de 1970. Frequentava o bar da Associação Brasileira de Imprensa, ABI, local de encontro dos intelectuais da época, ao lado de grandes escritores como Abel Pereira, Jorge Medauar, Adonias Filho, Rubem Braga, Homero Homem, Fernando Sabino, Nélida Piñon, Clarice Lispector e outros. Numa fase desinibida e participativa, contrastando com a adolescente calada e introspectiva, conquistou espaço na imprensa carioca, escrevendo para revistas e jornais de circulação local e nacional (1948/1972).
 
Em 1956, publica seu primeiro livro, uma obra híbrida, Chão e Poesia. Em 1960, lança Círculo do Medo, um livro de contos. E, em 1961, publica seu último livro, o romance Muro Frio. Elvira fugiu dos temas regionalistas e não escreveu sobre a cultura do cacau. Pelo contrário, suas personagens retrataram as angústias e conflitos do ser humano sem apresentar soluções, apenas constatando o hiato existente entre o desejo e a ação humanas, numa representação quase auto-biográfica e usando uma linguagem extremamente hermética e que não obedecia ao estilo daquela época. Com um sorriso encantador, bonita, inteligente, educada e querida, mas incompreendida em sua época, a tristeza foi tomando conta de Elvira Foeppel, afastando-a dos amigos e da vida. Sua morte se deu em completo anonimato, em 1998, no Rio de Janeiro.
 
A história da Violeta Grapiúna foi reconstituída por Vanilda Mazzoni, membro do grupo de pesquisa coordenado pela dra. Ivia Alves, da UFBa, que participou do projeto que visa a resgatar a biografia e a produção literária das escritoras baianas do período de 1940 a 1960. A dissertação de Mestrado foi aprovada com louvor, em dezembro de 2001, e agora está sendo aprofundada como tese de Doutorado, cujo tema é a análise vertical das publicações dispersas de Elvira Foeppel, as quais serão estudadas com maior profundidade sob o ponto de vista da temática sartriana do Existencialismo.
 

Maria Schaun
Jornalista e escritora
Ilhéus, 22 de janeiro de 2002.
Publicado no Diário de Ilhéus

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