sábado, 23 de março de 2013




 
   Denise Almeida




















quero uma ciranda que reinvente a alegria,
que não deixe a indiferença do homem cegar mais este dia.
quero uma ciranda livre, linda, virulenta, cabal,
que não deixe a violência do homem tornar este dia fatal.
que a ciranda seja, se possível,
sobre alguma sombra de árvore ou resquício de flor
e dela floresça uma criatura linda, livre, lenta,
alguém que me dê a mão e, acordado,
me entregue algum amor.
quero uma ciranda para cantar que estou acordada
e tenho a dar mais que amor.
quero uma ciranda urgente, uma ciranda
que reinvente o saber, o sabor , a sabedoria,
que não deixe a diferença entre os homens
ser mais que alergia ou alegoria.
quero uma ciranda leve, livro, laica
com enorme fé no ser humano ou
no que ele esqueceu já de humano
no dia em que se perdeu.
como quero uma ciranda, num campo de lavanda,
uma ciranda criança que seja profundo abraço natural
nas coisas do homem e nas que cercam o seu nome.
quero, como quero, esta ciranda de gente
que a cada dia se pareça e se torne mais gente.


( caso a ciranda não venha
conforme melhor me aprouver
já foi ciranda o p-o-e-m-a:
ah, inculta brenha do que vier...)











Para José Inácio Vieira de Melo


Quem desce a rua da alegria
mesmo na esquina com tristeza,
mais cedo ou mais tarde,
encontra a sua Paris...

Eu não posso deixar de dizer
que um dia, na minha própria rua,
sem França alguma,
tive que ser mais que feliz.

Quem quer que a alma voe
aprenda a bordar
a sua própria matiz.

Lá estou só: uma torre, um céu,
alguns humanos pássaros
mais o seu corpo,
que me perdiz.





 





– Hoje quero domesticar o mundo.
Tudo em mim será mais que cão:
encarnarei e encarniçarei o abandono!

O mundo me devolve no obsoleto
um pueril e gentilíssimo riso:
mas é tua forma que se encaniça e
desencarna, que se abandona em cão...

eu me domestico da arte de entender
que meu entendimento e ser
são só outra manufatura.
sobrevém uma paz
absurdamente impura.

tão só o engenho do querer,
o tolinho ofício de tentar sentir ou
domesticar mais que alinhar,
-------------------alinhavar ou
d-e-s-a-lie-n-ar .




Denise Almeida é poeta e ensaísta, graduada em Letras pela UFMG, e docente livre na rede estadual de Minas Gerais.

Bordados: Família Dumont

13 comentários:

  1. Denise teu poema é uma dança verbal...deliciosamente de ler..Parabéns.

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  2. Belissimos poemas! Lindos... leves... sensiveis... livres...
    Parabens a Poetisa Denise Oliveira.

    Margareth.castro@yahoo.com.br

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  3. Linda ciranda de Paris à crianças. Estonteante rodopiar para não alienar.
    Bjs Eliane.

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  4. Gostei dos poemas cheios de vida! Ciranda urgente,poesia sempre!

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  5. Lindos poemas, Denise... nos soa féericos, cheios de sonho, num emaranhado de sentidos e alusões subentendidas...

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  6. Belos versos, majestosa Poesia. É impressionante como a leveza e a vitalidade das inebriantes palavras se harmonizam,assemelhando-se ao gostoso balanço do mar, ou melhor, do velejar da BARCAÇA, conduzindo-nos a um diletantismo sem fim.Bravíssimo, cara Poetisa!!!

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  7. tão só o engenho do querer,
    o tolinho ofício de tentar sentir ou
    domesticar mais que alinhar,
    -------------------alinhavar ou
    d-e-s-a-lie-n-ar ..............Sua poesia tem a leveza das flores, mas marca como espinhos....ou seja, tem poder...abraços.

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  8. Bom dia, Denise! Delicioso poema. Um mundo de coisas nas entrelinhas e uma descontrução gostosa de ler! Parabéns!

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  9. Vamos CirANDAR!
    Vamos nos permitir enCANTAR, BORBOLETAR, FELICITAR!
    Sua escrita nos convida a exercitar o movimento do intelecto, saber que ser feliz é passo lento do existir. Passo lento de APROVEITAMENTO.
    Que cirANDA movimento, rodopio,junta mãos e pensamento... VAMOS MESMO CIRANDAR!!!

    Belíssimos poemas!
    Coloriu meu DOMINGAR.

    Beijinhos poéticos.

    Cássia Dall'Igna

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  10. A minha alma voa porque a minha matiz é irisada com a poesia de Denise e das outras marias desta barcaça capitaneada por Rita Santana. De mãos dadas, somos todos poesia e dançamos a ciranda da vida. A presença do José Inácio, meu poeta, me deixa mais alegra ainda, porque ela também me perdiz. Beijinhos!!!

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  11. "Quem desce a rua da alegria
    mesmo na esquina com tristeza,
    mais cedo ou mais tarde,
    encontra a sua Paris... "

    Costumo dizer que a poesia é o agasalho das palavras. Encantei-me com os versos acima, por residir neles um paradoxo: é como me remetesse às ruas empoeiradas, mas não deixando de trazer dentro de mim a alegria de uma rua parisiense. FANTÁSTICO! Viva um dia com poesia! Izabel T. da Rosa

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  12. Olá!
    Muito bonito o poema da reinvenção da ciranda... depois desta ciranda gostarei de tudo o que vier no BARCAÇAS.
    Paz & Luz!

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  13. Minha querida amiga, saudade das nossas prosas, das nossas conversas e especialmente da sua alegria de viver orintando as minhas esperanças poéticas...Sinto muito por não poder estar presente em Ilhéus no dia em que você e a Daniele estiveram para falar sobre a poesia...Desejo um sucesso imenso para você!

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