sexta-feira, 16 de março de 2012

Poemas de Jovina Souza













A Poeta e a Lua



Nesta noite, lua prateada e intrépida
Me sento na lembrança de sentidos insólitos já perdidos
Meu coração,
Em vão, procura sentidos novos
Para tua imagem de milênios.
Não acalentas mais os beijos dos apaixonados,
Estão nos motéis e nas penumbras sem graça das cidades.
Lembras das noites de roda e de chicotinho queimado?
Homem virando lobisomem e tu majestosa e cheia
Cacheando os cabelos da mãe d`água?
Aqui, ficas presa no céu estrelado sem serventia
Mercadoria de xamãs capitalistas
Por que não vens sentar na minha janela?
Venha me dar as mãos
Vamos dividir a solidão de estar fora dos sentidos
Esta maldição de bruxas petrificadas
Esta sina pesada, sem descontínuos










Destino de um verso
 

Meu verso não quer só técnica, estudo, métrica e rimas.
É um guerreiro sagaz a correr pelas ruas,
Pelas faces, pelos olhos, a espreitar nas esquinas.
Quer o sentimento sincero, brotar com a emoção
Não deseja a tranquilidade dos lagos, nem das brisas
Nem o descanso monótono da perfeição.
Meu verso se constrói na luta cotidiana do viver,
Ele é sonho, refúgio da vida,
Ele vem da vida,
Pensa na vida.
Quer ser todos os sentidos, a cabeça, os braços
E as mãos.











Pela janela



Abro a janela, não encontro a vida que pedi a Deus,
Lá está a vida por um triz
Um triz para viver, outro para morrer.
A vida que desfila descuidada nos limites do adeus
E se enche de finais: fim do amor, do prazer, dos que amamos
Fim de todos e de quase tudo.
Na minha janela passa meu semelhante, de pernas curvadas,
A vida pesando nas costas,
Doendo nos olhos e no coração
Sem comer, sem beber, sem beijar,
Esvaindo-se no  tic-tac   dos relógios.
Posso ver ainda o astro rei
Levantar-se do sepulcro todos os dias, espalhando raios pelo mundo,
Fazendo renascer a sementeira das ilusões necessárias:
O sonho de ganhar um amor doce que nos faça rir,
Criar os filhos,
Ter aquela grana para realizar os sonhos miudinhos...
Ter saúde e viver tão longamente que talvez nem morra.
Mas, a vida segue sem promessas, sem respostas, sem alentos,
Segura, altiva,
Para destino ignorado
E a poeta ainda espera a passagem do arco-íris

  










 Reencontro


Esta pequenina pétala nos meus braços
Vem das flores gigantes, e viçosas
Plantadas por minhas tataravós, bisavós, avós
E por mamãe
Nos quatro cantos do Brasil
Plantaram canaviais,
Arrancaram ouro das pedras
Diamantes dos rios
Fizeram cabedais.
Jorraram leite na boca de todos os brasileiros
Onde tinha fome plantaram grãos
Músicas, danças, sabores
E cores,
Riquezas do nosso país.
Em todos os pântanos fizeram jardins multiflores
Quero respeito para as mulheres pretas parideiras
Dos muitos Brasis
E Para toda gente negra que em tudo bota tento
Só constrói, conserta, não arrebenta
Que nossos malungos criancinhas
Possam seguir em frente,
Pulando amarelinha com a barriga cheia de leite
Bons ensinamentos
De bem com o espelho
longe da morte matada. 




  
Preta eu sou.


Negra como as tetravós de lá e as bisavós de cá
Preta , bem preta. Preta no cabelo, na pele
E o coração
A enegrecer minha cabeça todos os dias.
Da minha árvore genealógica, os galhos negros
Me interessam
São deles minha beleza e minha riqueza
Pra eles quero cantar.
São meu porto seguro, meu abraço
Suas histórias preciso contar
Para refazer
E revelar.






Foto da Flor: Rita Santana

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