sexta-feira, 2 de setembro de 2011

O HOMEM QUE NÃO DORMIA











 BERTRAND DUARTE








 EVELIN BUCHEGGER







 
  MARIANA FREIRE








  RAMON VANE








 LUIZ PAULINO






 


  EDGARD NAVARRO



  FÁBIO VIDAL








 EQUIPE DO FILME








 RAMON VANE
 


n
NÉLIA CARVALHO








ABAIXO A ZONA DE CONFORTO
 Breve e Livre aproximação do filme “O Homem que não Dormia” de Edgard Navarro.



            “O Homem que não Dormia” já não me deixa dormir em paz. Ele fica ali, espreitando entre as imagens hipnagógicas e, ao meu menor vacilo, invade os meus melhores sonhos e os meus piores pesadelos. Desde que o vi pela primeira vez na sala do Teatro Castro Alves, encerrando o Cine Futuro, que ainda prefiro chamar Seminário de Cinema da Bahia, toda noite e toda manhã ele comparece pra me incomodar, com suas imagens inesquecíveis.

              Você deve ver esse filme ímpar pelo menos uma vez, você não o esquecerá, e ele também não vai se esquecer de você, vai lhe atazanar um bom tempo. É um filme para aqueles que vão ao cinema  não somente para preencher algumas horas com o já conhecido, ele te pega pela garganta e propõe o seu jogo  de mexer com suas entranhas e seu bem-estar, ele não te dá espaço para a pipoca.

            “O Homem que não Dormia” tem irmãos mais e menos conhecidos:“Saló”, de Pasolini,” A Idade da Terra”, de Glauber Rocha,” A Comilança” de Marco Ferreri e “O Baixio das Bestas” de Cláudio Assis,  entre não muitos. É aquela obra cinematográfica que não faz acordos com nada, nem com a bilheteria, nem com a crítica, nem com a censura que habita todos nós. Ela existe para perturbar, para criar a discórdia, para lançar irmão contra irmão, filho contra pais, amigos contra amigos.

            O filme é alucinante na sua construção e rico das mais variadas possibilidades de interpretações, neste ponto ele é extremamente poético. Ele é também aquoso, no manuseio das nossas excreções líquidas: esperma, urina e lágrimas. Ele é fragmentário por opção e totalmente cruel, aquela crueldade de que nos falava A. Artaud.

          A estória no “Homem que não Dormia” é o que menos importa, ela é apenas um pretexto para Navarro penetrar nossas mentes e semear contradições.

            Entendo “O Homem que não Dormia” como o encerramento de um ciclo, Navarro é um cineasta visceral e circular. O primeiro ciclo, em Superoito, foi formado pelo Rei do Cagaço (Fase Anal), Alice no País das Mil Novilhas (Fase Oral) e Exposed (Fase Fálica). O segundo ciclo que agora se encerra, tem início com o  Superoutro (Ode a Loucura), Eu me Lembro (Abordagem  do seu  eu no seu próprio tempo) e agora  o alucinante e sofisticadíssimo “O Homem que não Dormia”, poucos cineastas têm uma obra tão intimamente ligada ao seu autor.

             Tangenciando “Teorema“ de Pasolini, a chegada do peregrino desencadeando no povo a missão de exumar o capital escondido pelo Barão, uma botija com diamantes enterrada, é similar à chegada da personagem de Terence Stamp, no âmbito de uma família burguesa e sem sonhos, numa Itália conflagrada.  Através do desejo-sexo, provoca mudanças radicais nesse núcleo reacionário. Edgard prefere colocar o motor das mudanças que redundam em uma nova consciência, no capital perdido, sonegado pelo poderoso, que mesmo após a morte estabelece uma maldição permanente: é proibido dormir, sem sono não há sonhos, sem sonhos perdemos grande parte do imaginário  e nos afastamos do inconsciente coletivo que permeia a raça humana.

             Provavelmente por assistir tão somente uma vez ao filme, muita coisa não me foi possível apreender, mas as imagens poderosas colam em nossa memória de forma totalmente pregnante. Evelyn Buchegger tem uma interpretação monumental, entregue aos papeis com a força de um furacão, RamonVane forma um Pafrente Brasil burilado até o último detalhe, o inocente torturado por engano faz parte das dívidas que a ditadura marcou a ferro e fogo na nossa pele. Psit Mota, Bertrand Duarte, Fabio Vidal, Bertho Filho e Mariana Freire completam o elenco principal de forma extremamente talentosa, sem esquecer da própria interpretação de Edgard como o Barão sanguinário, perfeita  composição, e de Luiz Paulino, numa interpretação minimalista e profundamente comovedora.

            Hamilton Oliveira faz a mais arrebatadora, expressiva e arriscada fotografia entre todos os filmes baianos em que trabalhou. Quando se pede beleza  ele é clássico, quando se pede movimento ele comparece com uma  câmara angustiada, na mão, buscando estilhaços de significados em cada enquadramento.

            Nicolas Hallet nos traz um som funcional e criativo, ouvimos até o mais leve sussurrar e as vozes da natureza que dialogam com as personagens. Confesso que não tive tempo para apreciar a trilha sonora, mas ela esteve em todos os momentos em que quase me afundei na cadeira, dizem que a melhor trilha sonora é a que não se percebe, ela está tão imbricada com o todo que não podemos vê-la só, mas vou ouvi-la em outras exibições,  afinal pretendo assistir ao filme várias vezes e, numa delas, de olhos fechados.

             Pra Frente Brasil que atrás vem gente, cuidado com a Mula sem Cabeça, os Cegos masturbadores vão te enxergar nas esquinas, o Lobisone na lua cheia arranca teus sapatos.

             Mitos populares, Jung, Chapada Diamantina.

             É preciso exorcizar os eguns, principalmente Garrastazu, abram-se todos os arquivos da ditadura.

          E no final tudo se junta: Marujada, procissão de Pentecoste, Burrinha, Orquestra de Fred Dantas, Folguedos Populares e o  povo,  amarrados em balões coloridos sobem  juntos para o azul do oxigênio que chamamos de céu.

            É urgente assistir mais de uma vez ao “Homem que não Dormia”.

Fernando Belens
Não crítico cinematográfico


FILME SELECIONADO PARA O FESTIVAL DE BRASÍLIA

As comissões de seleção das três categorias reuniram-se em Brasília, entre os dias 4 e 11 de julho. Os seis longas-metragens foram selecionados de um total de 110 filmes. Compuseram a comissão de seleção de longas os cineastas André Klotzel, Cibele Amaral e Monica Schmiedt, o diretor e produtor Flávio Ramos Tambellini e o jornalista e professor de cinema Sérgio Moriconi.

FILMES SELECIONADOS

MOSTRA COMPETITIVA DE FILMES DE LONGA-METRAGEM
- As hiper mulheres, de Carlos Fausto, Leonardo Sette e Takumã Kuikuro, 80min, RJ/PE
- Hoje, de Tata Amaral, 90min, SP
- Meu país, de André Ristum, 90min, SP
- O homem que não dormia, de Edgard Navarro, 95min, BA
- Trabalhar cansa, de Juliana Rojas e Marco Dutra, 99min, SP
- Vou rifar meu coração, de Ana Rieper, 76min, RJ

http://festbrasilia.com.br/2011/noticiasver/festival-anuncia-selecionados-para-as-mostras-competitivas


PROGRAMAÇÃO DO DIA 30 DE SETEMBRO

20h30 e 22h40, Cine Brasília
20h30, Teatro de Sobradinho, Cinemark Taguatinga Shopping e Teatro Newton Rossi, Ceilândia
Mostra competitiva, classificação 16 anos
Media training, de Eloar Guazzelli e Rodrigo Silveira, 11min39, SP (animação)
Cafeka, de Natália Cristine, 2min29, RS (animação)
Elogio da Graça, de Joel Pizzini, 25min, RJ
Três vezes por semana, de Cris Reque, 15min, RS
O homem que não dormia, de Edgard Navarro, 95min, BA

http://festbrasilia.com.br/2011/programacao/30


Fotos: Calil Neto

6 comentários:

  1. Olá querida, que coisa boa essa resenha de filme
    que nos mostras. Parece mesmo ser um filme muito interessante, e as imagens desses personagens são muito fortes! Tomara que passe no circuito nacional para que eu possa assistir. Estou curiosíssima!
    Obrigada pela visita, fico sempre muito contente
    quando me dás esse prazer. E obrigada também por tuas generosas palavras.

    Um beijo grande e bom final de semana

    ResponderExcluir
  2. Cirandeira,obrigada! O seu blog é um recanto de delicadezas imensas. Beijos gratos! Vamos torcer para que o filme consiga ultrapassar as barreiras quase intransponíveis de exibição e distribuição desse Brasil.

    ResponderExcluir
  3. o filme ainda não vi,mas a critica é uma coisa linda.

    ResponderExcluir
  4. Ficou muito bom. Estou louco para vê-lo.
    Caríssima, venha participar do nosso novo teste cinematográfico. Katharine Hepburn é o tema.

    O Falcão Maltês

    ResponderExcluir
  5. Pô, fiz um comentário imenso e parece que não saiu. Ou eu to desapredendo?

    ResponderExcluir
  6. Ao ler a resenha de Fernando Belens, lembrei-me de um trecho do livro de Mia Couto - Um Rio Chamado Tempo, Uma Casa Chamada Terra – onde um dos personagens dizia que nunca dormia na mesma cama com uma mulher porque ela poderia roubar-lhe os sonhos. Ele ficava na cama para fazer amor com ela, mas não para dormir. Achei muito engraçado e, na época, divaguei muito sobre o assunto. Fazia sentido e continua fazendo.

    Então fico pensando no filme O HOMEM QUE NÃO DORMIA. O título, por si só, já instiga e intriga. Por que será que não dormia? Teria medo que lhe roubassem os sonhos? Bom, só vou saber quando tiver a especial oportunidade de sentir o texto de Edgard Navarro através dos seus personagens, da ambientação... Igatu - memória das pedras – na beleza impressionante da Chamada Diamantina.

    É terrível a gente ler e ouvir a respeito de algo imperdível e não poder ir correndo pra saciar o desejo. Impotência. É esse o meu sentimento quando sei da genialidade desse diretor (eu vi O Superoutro e Eu Me Lembro) porque não tenho o poder de trazê-lo (o filme, viu gente) para onde estou. Infelizmente essa política desgraçada de divulgação do filme nacional é segregadora.

    Por fim, quero dizer que embora o conceito de sucesso seja relativo, mas desejo sucesso para O homem que Não Dormia. Ao mesmo tempo confesso o meu pecado capital: a inveja de quem já foi privilegiado de assistir ao filme e dos que verão logo. Terei que esperar...

    Abraços e mais abraços
    Neuzamaria
    www.neuzamariakerner.blogspot.com

    ResponderExcluir